quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Os fundamentos da antropologia social. Abordando o fenômeno da reciprocidade 2.

Autoras: Rebecca Patas & Tatiane Fernandes

Retomando e aprofundando o assunto da aula anterior, sobre o texto de Marcel Mauss, a aula de 26/10/2010 deu ênfase ao potlatch. O primeiro tema abordado foi a metodologia da Mauss, que explica as dádivas, os rituais, os fatos por meio da lógica interna de cada sociedade, citando vários exemplos, reforçando esse sistema lógico diferenciado. Mauss divergia dos evolucionistas no que diz respeito à comparação: segundo o ‘método comparativo’ desses últimos, tudo se mistura, e os objetos, instituições, costumes e crenças são abordados de uma forma descontextualizada. Para Mauss, tinha que entendê-los dentro do contexto onde eram praticados e criados.

Malinowski também insistia no estudo desses fenômenos em contexto. Como ele, Mauss rejeitou a idéia de “economia natural”, - baseada no pressuposto de que os indivíduos desejam apenas satisfazer suas necessidades, apenas fazer o que querem. Assim, defende que todo o ser humano nasce social, não egocêntrico natural. É perceptível a influência durkheimiana no trabalho de Mauss.

Quando de contempla a troca como base de um tipo de economia (que é social e não ‘natural’), as prestações não se dão como simples escambo, são dádivas que implicam numa relação duradoura. Para melhor compreensão, há uma comparação com os dias atuais: o escambo, como o comércio, é uma troca que não gera ligações profundas; em contraste, presentes de aniversário ou as comidas e festividades oferecidas na forma de dádivas, como o caruru de São Cosme e Damião, geram um laço entre os que participam, inclusive, os próprios santos que são convidados para se alimentarem das oferendas. Estes também engajam em relações sociais com os vivos que estão cumprindo antigas promessas.

Uma "prestação total" é aquela que envolve e integra elementos multiplos da vida social, religiosa, política, econômica de uma pessoa ´moral - quer dizer, uma pessoa jurídica (como um clã) ou física - normalmente, uma pessoa que representa uma coletividade, como um clã. Uma "prestação total se da por toda a comunidade: ao dar ou receber presentes e outras oferendas, sua representante contrata por todos, por tudo que possui e por tudo que faz.

Um exemplo dessas prestações totais é o potlatch, ritual dos povos nativos do litoral pácifo do noroeste do continente norte-americano abordado no texto de Mauss, como os Kwakiutl, Tlingit, Haida e outros. O potlatch acontece no inverno, que diz respeito ao ciclo anual, época de recolhimento que gera excedente. É realizado pelo chefe do clã, que convida outro chefe e seus parentes. A tribo convidada chega de forma ritualística, e é recebida com presentes, cermonias e uma abundância de comida, durante dias ou até mais tempo.




A competição no potlatch, detalhe que lhe dá a classificação de “prestação total de tipo agonístico”, se dá quando o convidado tenta superar o anfitrião no seu potlach de retribuição. Há um exagero de gastos, que tende a aumentar, consumindo bens de todo o tipo. Os governos canadense e estadunidense proibiram o potlatch no fim do século XIX, por considerar o ritual uma perda "irracional" de recursos – lembrando que em cada potlatch se consumia mais que o anterior. Com a compreensão do significado do potlatch, a proibição desapareceu em 1934 nos EUA e em 1954 no Canadá. A queima e destruição desses bens é uma oferenda aos deuses, o sacrifício, baseado nessa extinção de riquezas.

A professora apresentou uns slides com imagens de casas Kwakiutl, Tlingit e Haida e também de pessoas dessas nações que participavam dos ciclos de prestações do potlatch. Também detalhou outras características do potlatch, explicando que é realizado para celebrar uma ocasião social, por exemplo, marcando um evento importante (nascimento de uma criança, a puberdade feminina, os ritos funerários e o comércio); tem a função de adquirir status para o chefe, que é a encarnação da coletividade; e tem diferentes níveis de importância.

No outro lado do oceáno Pacifico, também existe "prestações totais", mas não existe potlatch. Mauss discute os tonga, presentes que um clã da para outro segundo relaçoes de parentesco e casamento. Os ciclos de prestações em Samoa já não são competitivos, ou seja, são bem differentes daqueles do potlatch. Mauss construi o esquema da sua explicação sobre as prestações de tonga - e sobre as dádivas em geral - através de uma discussão da noção Maori de hau. A obrigação de retribuir um presente dado (taonga)entre os Maori de Nova Zelândia vem do hau, o espírito da natureza e dos animais, que está nesse presente e deseja retornar ao seu lugar original. Assim, aquele que recebeu esse bem deve retribuir com outro bem, sob pena de reter esse ciclo. Caso não retribuem o presente com um outros presente, a conseqüência será doença e morte.

A obrigação de dar e receber é importante para a manutenção da sociedade: a recusa destes presentes é a recusa das relações sociais, gerando conflito. O sacrifício é uma espécie de dádiva aos deuses, da onde também se espera essa reciprocidade. As dádivas aos homens e aos deuses, portanto, têm a finalidade de comprar a paz com uns e outros.

Referências Bibliográficas:

Mauss, Marcel. ‘Introdução: Da dádiva, e em particular da obrigação de retribuir os presentes’ e capítulo 1 ‘As dádivas trocadas e a obrigação de as retribuir (Polinésia)’ .In Ensaio sobre a Dádiva.

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